Até que a morte nos separe – parte 1

Primeira parte do conto policial Até que a morte nos separe, escrito para o projeto "Em um mês, um conto".

Este conto policial foi escrito para o projeto Em um mês, um conto.

A antologia completa, As Faces do Crime, pode ser adquirida como livro físico e também em formato de e-book.

Aproveite a leitura!


Era tarde da noite e o Batalhão da Polícia Militar de Alto Paraíso de Goiás, no interior do estado goiano, estava completamente vazio, com exceção da novata. Os policiais que estavam trabalhando naquele horário faziam uma ronda pelas ruas. 

Geralmente era Antônio, comandante e o mais velho dentre eles, quem passava a madrugada ali para cuidar de tudo, mas como sua filha estava com febre preferiu sair um pouco mais cedo e cuidar da criança, deixando a jovem em seu lugar. 

Ela não esperava que alguém ligasse e muito menos fosse até lá. Afinal, acontecer nada não era algo incomum em uma cidade que abrigava menos de dez mil habitantes e, ainda que muitos turistas visitassem o local para conhecer suas famosas belezas naturais, a maior parte das queixas eram a respeito de festas e jovens embriagados.

Carla estava completando exatos trinta dias de trabalho no local. Até então não havia tido nenhum problema e, mesmo sendo a mais nova e única mulher do grupo, era bem tratada pelos seus colegas. 

E, é claro, morar em uma cidade paradisíaca tinha seus benefícios. São poucos os que não querem se aventurar na Chapada dos Veadeiros e conhecer seu lado místico, que vai muito além de lendas sobre alienígenas.

Mas isso não significa que crimes não aconteciam ali. Como crescera na região, ela sabia que vez ou outra ocorriam atrocidades, desde estupros a assassinatos. No fundo ela sempre soube que não importa onde vivemos, o ser humano é capaz de fazer qualquer coisa. 

Foi por essa razão que decidiu seguir a carreira que escolheu. Na verdade, ela queria mesmo era ser investigadora ou detetive. Cresceu assistindo Scooby-Doo e lendo as histórias protagonizadas por Sherlock Holmes. 

A sua ideia era fazer Direito e depois se especializar. Como não conseguiu uma nota boa o suficiente para ingressar em uma instituição pública, batalhou para fazer um financiamento em uma universidade particular e viveu por cinco anos na capital para concluir o curso. Nessa época, seu pai ficou doente e ela precisou voltar para cuidar dele, então desistiu da pós-graduação e prestou um concurso para a polícia.

Estava imersa em seus pensamentos e planos mirabolantes para o futuro quando, de repente, escutou um som que a fez voltar para a realidade. O telefone estava tocando. O que aconteceu a seguir não foi nada que poderia ter sido previsto, ou pelo menos não por ela. 

Olhou rapidamente para o celular e conferiu o horário: meia-noite. Quem seria? Assustada com o barulho repentino e amedrontada com o que poderia ser, atendeu a chamada. 

— Antônio? Não sei o que fazer… Minha esposa está morta! Foi assassinada!

A voz do outro lado, masculina, tremulava a cada palavra. Estranhamente, parecia ser alguém conhecido, mas não fora capaz de reconhecer quem. 

Morta? Assassinada?

Ela ficou muda.

Até então, já havia lidado com alguns roubos domiciliares e brigas de rua, mas nada muito sério. Mas agora era diferente. Uma mulher estava morta. E seu assassino, seja lá quem for, está solto por aí.

— Alô? Tem alguém aí?

Havia esquecido de responder e, pra falar a verdade, ela não tinha nem ideia do que poderia dizer. O homem era ríspido, como se tivesse pressa. Ela conseguia perceber seu nervosismo.

— Estou ouvindo, senhor. Qual seu nome e endereço?

— Aqui é o Paulo! Não reconhece o prefeito? Só diga pro seu chefe, o Antônio, vir rápido até minha casa. Entendeu, menina?

A ligação foi encerrada e ela estava mais nervosa do que antes. Pior do que um assassinato era o assassinato da dona Ana. Sim, Carla conhecia ela muito bem. A mulher frequentava todos os eventos da região, sempre bem vestida. 

Até onde sabia, os dois haviam se casado bem jovens e desde então um não era visto sem o outro. Todos comentavam sobre como eles foram feitos um para o outro e que sequer brigavam. Ela mesma cresceu acreditando que aquele casal seria inseparável. Seria mesmo? Realmente, se algo poderia afastá-los, era a morte.

Foi aí que se deu conta de que não repassou o que ocorrera para Antônio e, como sabia que ele estaria com sua família, decidiu ligar para os seus colegas primeiro. De qualquer forma, era provável que houvessem visto algo estranho.

— Marquinhos?

— Oi, Carla, que foi? Vai me dizer que tá rolando outra festa por aí?

— Muito pior, Marquinhos, muito pior… O prefeito acabou de ligar, queria falar com o Antônio.

— Como assim? Uma hora dessas? E o que ele queria?

— Foi a dona Ana… Está morta. Ele disse que ela foi assassinada.

— Puta que o pariu!


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Amanda Pereira Santos
Publicitária, escritora, professora, consultora, palestrante, especialista em Influência Digital: Conteúdo e Estratégia, especialista em Marketing, Branding e Experiência Digital, com MBA em Comunicação e Eventos, MBA em Marketing Estratégico e Mestrado de título próprio em Comunicação Empresarial e Corporativa. Como docente, já ensinou Branded Content: Marketing de Conteúdo, Redação Publicitária, Marketing Digital para escritores e Estratégia de Design de Negócios.
Artigos: 42

11 comentários

  1. Quem matou Dona Ana? uma personagem tão importante da cidade. Deu pra captar bem certa ingenuidade da protagonista, ficou interessante contrastar com um assassinato.

  2. Adorei a primeira parte, estou indo ler a segunda agora! Fico curiosa para saber quem teria motivos para matar a Ana, que tipo de pessoa ela era… E você escreve muito bem!

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