Este conto policial foi escrito para o projeto Em um mês, um conto.
A antologia completa, As Faces do Crime, pode ser adquirida como livro físico e também em formato de e-book.
Aproveite a leitura!
A antologia completa, As Faces do Crime, poderá ser adquirida como livro físico e também em formato de e-book a partir de maio.
Aproveite a leitura!
— Não acredito que nenhum desses vizinhos chamou a polícia antes…
Novamente, Diego não se conteve.
— É, pelo visto ninguém tá a fim de dedurar o prefeito. Não quero nem imaginar o que mais acontece por aqui. Já ouvi alguns boatos…
— Boatos?
— É, porra, boatos. Você sabe que eu adoro encher a cara depois do serviço e bêbados adoram falar mais do que deviam…
— O que você escutou?
— Isso não interessa agora…
— Não?
— Que pressão é essa? Ele é o prefeito, cara, acha mesmo que só tinha olhos pra Ana? Até onde eu sei, ele aproveitava bastante as viagens que fazia “a trabalho”.
— Como assim aproveitava?
— Não é possível que você seja tão inocente… Soube que ele saía com muitas mulheres, algumas até menores de idade.
— Caralho!
— É, e tem mais… Há quem diga que ele já se envolveu com tráfico e foi visto usando algumas pílulas por aí. Acho que pensava que ninguém ia descobrir sua identidade se estivesse em outra cidade. Ou só queria aparecer mesmo, foda-se.
— Foda-se?
— É, foda-se. Nada disso importa perto de um assassinato.
— Você acha que ele matou?
— Talvez. E você?
— Talvez.
Os dois se calaram quando, repentinamente, Paulo desligou o telefone. Deu um gole e terminou o restante de vinho que restava na taça antes de quebrá-la em uma das paredes. Então, sem mais nem menos, saiu da sala. Quatro minutos se passaram até que ele voltasse, com alguns produtos de limpeza.
Agora era a hora, não havia mais tempo para pensar. Se ele estivesse tentando esconder algo que fez, precisavam impedi-lo e a única maneira de fazer isso era entrando na casa sem que ele percebesse.
Estavam cada vez mais perto da porta. Marquinhos encostou na maçaneta e sentiu um calafrio. Olhou para trás e, por breves segundos, se sentiu bem por estar com seu amigo e não sozinho.
— E aí, você vem?
— Claro, Marquinhos, tô atrás de você.
Abriu a porta e começou a perseguir a luz a passos lentos. Conseguia sentir o cheiro forte de sangue, que se misturava com os odores de álcool e alvejante. Respirou fundo e seguiu até a entrada da sala.
O homem estava tão imerso tentando limpar o chão ao lado do defunto que nem percebeu a chegada dos dois homens ali. A cena era horrenda. A mulher estava largada ali, descalça e de camisola, com os olhos arregalados como se não acreditasse no que havia acontecido.
Seus cabelos estavam despenteados e a maquiagem borrada em seu rosto. O que mais chamava atenção, obviamente, era a cor vermelho vivo que destacava-se em suas vestes. Um tiro no peito.
Não havia dúvidas de que estava ali há muito tempo, pois o sangue estava seco e sua pele extremamente pálida, como nunca viram antes. Justamente por isso que Paulo estava demorando tanto com aquela atividade, pois claramente era a primeira vez que limpava algo e a textura não ajudava.
O desgraçado deve ter esperado horas antes de fazer a ligação. Provavelmente cometeu o ato por impulso durante alguma briga e depois não soube como agir. No impulso, ligou pro amigo diretamente no telefone da delegacia, sem perceber a idiotice que estava cometendo ao denunciar o crime para a polícia.
Foi quando Diego esbarrou em um dos móveis que Marquinhos anunciou sua presença, com a arma apontada para o criminoso. Queria esperar mais um pouco, mas era agora ou nunca.
— Parado, Paulo! Nós vimos tudo, você vem com a gente.
— Vou é?
— Não deixe isso mais complicado do que é… Você matou sua esposa e agora vamos algemá-lo até a delegacia.
— Garoto, você se esqueceu de quem eu sou?
— Pra te falar a real, eu não dou a mínima. Um homem que mata a esposa não passa de um cuzão.
— Cuzão? Essa vagabunda me traía há anos! Eu nunca nem imaginei… O que você queria que eu fizesse?
— E você não fazia o mesmo? Me poupe dessa ladainha. As pessoas falam, Paulo. Todo mundo sabe que você pegava qualquer uma quando saía por aí.
Agora o prefeito fora pego de surpresa. Até então, pensava que ninguém sabia de nada. A quem ele queria enganar? Era óbvio que em algum momento saberiam. E, se os outros sabiam, Ana deveria saber…
— Pois então eu vou assumir minha responsabilidade, do meu jeito.
O que se passou a seguir foi tão rápido que nem Marquinhos nem Diego conseguiram reagir. Paulo pegou a arma, encostou-a em sua própria cabeça e apertou o gatilho. Seus miolos se espalharam por todo canto enquanto seu corpo caía sobre a vítima.
Era isso. Os dois policiais permaneceram parados por um longo tempo até que o celular de Marquinhos começou a tocar.
— Carla?
— Vocês dois estão bem? O Antônio não atendeu minhas ligações e você não me avisou nada!
— Nós estamos, mas o Paulo…
— O que aconteceu?
— Ele está morto?
— Morto?
— Sim. Vimos que ele queria se safar e entramos. Cometeu suicídio quando nos viu.
— E agora?
— Acabou. Não podemos fazer mais nada aqui.
Amei demais! Sua escrita é ótima e fluida, foi muito agradável a leitura. Só me restou revolta com esse Paulo… E saber que esse tipo de crime acontece sempre na vida real. Triste!
Que bom que você gostou, Bella, muito obrigada por comentar! Confesso que não foi fácil escrever sobre um feminicídio, mas me esforcei pra fazer um bom trabalho.